Inveja no trabalho é necessariamente ruim? Saiba como lidar!

inveja no trabalho

“A inveja é destruidora”. Quem nunca ouviu esta frase? É um sentimento mal visto, e pode realmente causar prejuízos nas relações. Mas será que não pode servir para algo realmente útil, principalmente no ambiente de trabalho?

O ambiente das corporações é complexo. Os colaboradores podem cooperar ou competir entre si, dependendo do clima organizacional. Em ambientes tóxicos, da maneira como a inveja é levada, pode ser um sentimento arrasador. 

Abordaremos aqui os mecanismos da inveja e como ela pode afetar o trabalho.

É um sentimento dialético: pode ser visto de duas formas. Assim, há maneiras proveitosas de se lidar com ele que podem até mesmo levar uma empresa para um alto crescimento. Aliás, em uma estratégia de saúde corporativa, a educação emocional é um dos pilares.

Leia este artigo para descobrir mais! 🙂

O que é inveja?

A inveja é um sentimento social complexo. Sua existência depende da linguagem e da simbolização, em um nível mais profundo nos seres humanos adultos. Porém, é um fenômeno percebido em crianças e em outros mamíferos.

Por definição na psicologia:

“Inveja é uma resposta aversiva à resposta de alguém, a uma desvantagem ou inferioridade percebida de outro, em respeito ao domínio de alta importância.”

O domínio de alta importância significa aquilo que é desejado se ter, ao se comparar com o outro. O indivíduo usa esse domínio para se definir, logo para se comparar. 

Inveja e ciúmes: quais as diferenças?

A maior parte das pessoas sente vergonha de ter inveja, por isso ignora ou simplesmente não admite. É um sentimento mal visto. Diferente do ciúmes, o qual as pessoas confessam que tem. Embora este último seja mais aceitável socialmente, não é tampouco um bom sentimento.

Comparando ambos, o ciúmes é quando se quer proteger algo de bom que o outro tem. É um sentimento de posse. Ou seja, é querer ter algo do outro, mas esse sentimento não diminui a pessoa que o sente. Já a inveja é mais difícil. É uma resposta negativa sobre uma desvantagem em relação ao outro. 

Dessa forma, a inveja é o contrário do ciúmes, é uma falta. O ciúmes é um complemento, o qual não afeta tanto a autoimagem ou autopercepção de quem o sente.

De uma forma mais simples, pode-se definir:

Ciúmes: 

“Você tem algo de bom, quero ter esse algo de você, porém isso não me diminui.”

Inveja: 

“Me falta algo que você tem, logo me sinto em desvantagem ou menor em relação a você.” 

A Inveja na História

A inveja é amplamente abordada na literatura. Está presente nos textos dos antigos gregos, na Bíblia Sagrada, nas histórias de Shakespeare.

Motivada por sua força destrutiva, deusas gregas foram mortas, é considerada um dos 7 pecados capitais, Caim matou seu irmão Abel e Iago influenciou Otelo a matar Desdêmona.

As religiões a condenam em prol da união das pessoas. Dessa forma, se não existir, se perpetua o dogma. Do contrário, há uma dissolução do grupo.

Porém, há um demérito em muitos destes conceitos clássicos ao não abordar o caráter dialético da inveja: ela pode sim ter dois sentidos. Ou seja, pode ser também produtiva.

O grego filósofo Plutarco escreveu a obra no século I A.C.  “Como tirar proveito dos seus inimigos?”. De forma brilhante, há mais de 2.000 anos temos um ensinamento muito rico de como lidar com a inveja de forma bem atual. Um trecho de destaque vale a leitura:

“O fogo queima quem o toca, mas fornece luz e calor, serve a uma infinidade de usos para aqueles que sabem utilizá-lo. Examina igualmente o teu inimigo. Esta criatura, de um outro lado, nociva e intratável, não dá de alguma maneira ensejo de ser apanhada? Não pode prestar-se a algum uso particular? Não é útil? 

Assim, os imbecis maltratam suas amizades, enquanto os homens sensatos sabem dirigir para o seu proveito mesmo as inimizades. Em primeiro lugar, parece-me que o mais prejudicial na inimizade pode se tornar o mais proveitoso, se atentar nisso. E de que maneira?”

Plutarco

Inveja na natureza

Na natureza, existe em várias espécies a percepção de desigualdade, logo há o sentimento de raiva, como visto numa briga por alimentos. O famoso vídeo do biólogo evolucionista Frans de Waals, com a experiência da percepção com macacos, ilustra bem esse ponto:

A inveja surgiu como uma percepção do status social que o indivíduo tem ou de alguma iniquidade em relação aos outros. É um mecanismo emocional para se perceber em que local está, o que lhe falta e o que tem a mais. É uma espécie de sinalizador em relação aos demais.

Os mamíferos têm muita percepção de iniquidade, como os cachorros e macacos. Porém, a inveja é bem mais complexa no ser humano. Entre animais, quando a iniquidade se resolve, por exemplo, o alimento é dividido, este sentimento se esvai. Entre humanos é além, mesmo solucionando a falta percebida, fica ainda um resíduo de mal estar.

Inveja na Psicanálise: pode se relacionar com gratidão?

A psicanalista austríaca Melanie Klein , em 1957 escreveu o clássico “Inveja e Gratidão”. 

inveja no trabalho
Fonte: Google.

Não há profundas explicações do porquê a inveja realmente existe. Do ponto de vista psicanalítico, é uma intensificação do ódio. Se quer evitar esse mal estar, logo projeta-se no outro o ódio para não tê-lo contra si mesmo. Assim se dá o processo da inveja: 

  1. O indivíduo percebe que há algo que o outro tem que não possui, mas gostaria de ter
  2. Sente-se em desvantagem, logo inferior ao outro
  3. Percebe esta sensação e se sente mal
  4. Percebe que está com inveja, sente ódio
  5. Projeta-se o ódio sobre o outro, para não o ter consigo mesmo 

A inveja só existe quando o que o outro tem me importa. Um exemplo bem ilustrativo:

  • Alguém joga muito bem futebol, mas isso pouco me importa > não há inveja 
  • Jogo bem futebol, mas um conhecido joga 10 vezes melhor do que eu > percebo minha incompetência, logo fico com inveja

Para esse sentimento, há dois caminhos: 

  • Virar cobiça: tenho inveja de algo que cobiço, vira ódio contra o outro 
  • Virar obstinação: tenho inveja do que você tem, então devo me preparar para ter também, fico grato pelo fato de ter percebido esse ponto necessário do meu próprio desenvolvimento

Lutar contra o sentimento invejoso é um problema, pois atrai mais ainda a atenção para sua presença. A princípio, é um sentimento agressivo, mas pode ser ressignificado ao pensar em construir uma versão melhor de si mesmo. Principalmente quando sentimos inveja de pessoas que gostamos, como amigos e familiares. Podemos aprender com o outro, a perceber o que nos falta como um motivador a nos desenvolver. 

O invejoso que escolhe apenas com o lado do ódio é desadaptativo. O mais racional é buscar seu auto aprimoramento, ser grato de ter percebido o que lhe falta para enfrentar os desafios desse desenvolvimento.

Inveja no Trabalho

Há um interessante pesquisas sobre inveja que pode ser alimentada em ambientes de trabalho tóxicos. 

Um estudo publicado recentemente pela Current Psychology (2023) aponta que colocar indivíduos no ostracismo, negligenciar sua importância ou presença, já se sabe que isso pode causar em média um maior sentimento de inveja maliciosa e tendências agressivas.

Em ambientes muito competitivos ou de certa forma insalubre pelas relações ou excesso de cobranças, há um contexto difícil para os colaboradores. Se não há regras claras de carreira ou promoção, quando alguém é promovido pode ser visto como preferido de forma aleatória.

O clima do ambiente fica ainda mais negativo. Outros colaboradores ao se comparar, podem perceber que fizeram as mesmas ações, mas não ganharam igualmente.

Num contexto positivo, quando a inveja aparece e é trabalhada, há o crescimento de todo time e da empresa. Quando alguém não é promovido porque deixou a desejar em algum quesito que o outro cumpriu, pode ser um estímulo à sua performance. 

Porém, sem apresentar as regras de forma clara, as iniquidades são mal percebidas, vira a famigerada  “fofoca de corredor” – um valor paralelo que pode se agravar em uma série de problemas mentais. 

Dessa forma, no ambiente de trabalho a inveja pode ser entendida também como um fenômeno dialético, pois leva para dois caminhos: cobiça ou gratidão. 

Podemos odiar pessoas que alçaram alguma posição a qual desejamos ou entender como se faz para  preencher os “gaps”  necessários para se ter conquistas semelhantes. 

Conclusão

Como destacamos com o texto do Plutarco, o melhor jeito de lidar com inimigos é reconhecer o seu valor, para refletir em si mesmo alguma verdade ou necessidade de mudança.

Pela psicanálise, há dois caminhos: o ódio ou a gratidão. Negar a inveja por se achar uma “pessoa boa” pode apresentar ainda mais problemas. Reconhecer esse sentimento é positivo para lidar melhor. 

A inveja odiosa e paralisante deve ser evitada em qualquer ambiente, principalmente no trabalho.  Nada se constrói ou melhora se não tiver um olhar para o próprio autodesenvolvimento. 

Logo, trabalhar a inveja de forma construtiva é entendê-la  para o lado mobilizador, para construir um caminho para onde deseja ir, entender o que precisa aprender e se desenvolver.  

Começa por agradecer aos outros que funcionam como um espelho ao refletir as diferenças. Ser grato é o sentimento que muda as relações e a autopercepção para o bem. 

Fonte: Naruhodo 391: Por que sentimentos inveja?

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