Dá para aprender melhor fazendo pausa no trabalho?

pausa no trabalho: será que aumenta aeficiência?

Existe uma lógica implícita no mundo corporativo dos colaboradores se doarem 100% para serem exemplares. Assim, não devem perder tempo para ser ao máximo produtivos. 

Mas será que essa lógica garante a eficiência? A produtividade é melhor sem fazer nenhuma pausa estratégica?

Esse artigo vai na contramão do que se muito é praticado.

Melhore a eficiência do seu ambiente de trabalho: 

Leia para entender!

Como o cérebro aprende? É como um computador?

A ciência é feita para reduzir a incerteza que temos sobre os variados temas ao nosso redor.  Fazemos metáforas o tempo todo, principalmente para explicar certos sistemas. Há uma analogia popular de se comparar o cérebro humano ao computador. Porém, isto está muito longe de ser verdade.

A inteligência artificial é uma realidade. Já existem até computadores que conseguem passar em exames complexos de vestibular. Treinar uma máquina a aprender matemática, química, realizar uma interpretação de texto ou até mesmo fazer uma boa redação, já é uma realidade.

Aqui a cientista Noriko Arai, num TED em 2017, explica como realizou este feito de forma genial:

Can a robot pass a university entrance exam?
Noriko Arai

O computador tem um processador que realiza uma dinâmica de transmissão  de dados de um lugar para outro, com uma quantidade de memória num disco rígido, espaço o qual guarda esses dados. Aprende por um algoritmo durante a sua  execução, ou seja, durante as repetições das regras, com uma função para reduzir os erros.  

No cérebro humano, as memórias não são armazenadas, são sempre processadas e dinâmicas. São reconstruídas, com mais ou menos precisão, dependendo do contexto, das variações individuais e necessidades. São informações de curto e longo prazo, com mecanismos diferentes.  O seu aprendizado se dá na pausa. 

Ou seja, precisamos iniciar o recebimento de dados e realizar alguma prática para começar absorver as novas informações, como treinar uma habilidade motora como programação ou algum esporte. Porém, é necessária a pausa para o cérebro compreender de fato, consegui criar a condição necessária.

Por esse motivo, o nosso cérebro não é um computador. O aprendizado depende muito da dinâmica da formação das memórias, e isso tem tudo a ver com pausa no trabalho. Há dois tipos de memória:

  1. A memória explícita ou declarativa:  num nível de processamento mais químico, de curto prazo, resgata informação de fatos ou dados levados ao nosso conhecimento através dos sentidos e de processos internos do cérebro.
  1. A memória implícita: num nível de processamento mais físico, de longo prazo, resgata dados relacionados à aquisição de habilidades mediante a repetição de uma atividade que segue sempre o mesmo padrão. Nela se incluem todas as habilidades motoras, sensitivas e intelectuais, bem como toda forma de condicionamento. A capacidade assim adquirida não depende da consciência.

Um fato curioso sobre o cérebro: representa apenas 3% do peso do corpo, mas consome 20% de toda energia. Porém, é muito eficiente e consegue operar com uma bateria equivalente a 12 volts, ou seja, muito menor do que a de um computador como um laptop.

Além de ser econômico,  performa muito além de uma máquina. Se desenvolve ao máximo até os 25 anos, depois dessa fase pode haver um aperfeiçoamento.

Inteligências artificiais como o Chat GPT sabem dar boas respostas, mas não formular boas perguntas. São ótimos assistentes e compiladores de informação, pois têm acesso a uma base gigante de dados.

Segundo o psicólogo William James, temos acesso de forma consciente a uma pequena parte de nossos recursos mentais e físicos, porque operamos mais de forma automática (ou não consciente) a maior parte das vezes.  Um computador não tem essa dicotomia. 

O ser humano utiliza  100% da capacidade do seu cérebro, o qual fica sempre ativado de forma distribuída. Dependendo da atividade, pode ativar um pouco mais uma área mais específica.

A CPU (Central Processing Unit) de um computador, ou seja, o chip de silício que executa processos, não necessariamente é utilizada na sua capacidade máxima de 100%. E quando a faz, deixa a máquina mais lenta.

Como podemos ficar eficientes?

Em geral, quando começamos uma atividade para um novo aprendizado, precisamos praticar com bastante frequência no início. Quanto mais se pratica, mais as memórias de curto prazo se tornam de longo prazo, se estabelecem de forma não-consciente e mais automática.

Mas, para isso acontecer de forma eficiente, é necessário fazer as pausas. Em geral, a curva de aprendizado de algo novo é rápida no início, e fica mais lenta no fim. A sensação de aprimoramento de algo já “apreendido” é mais espaçado ao final do que no seu começo. 

O que diversos estudos trazem é que não fazer uma pausa gera uma menor entrega. O trabalho “Rapid Form of Offline Consolidation in Skill Learning” de 2019 pela revista Current Biology, mostra  que o cérebro fortalece as memórias por meio da consolidação pela pausa, ou seja, entre o final de uma sessão de prática e o início da próxima.

Não há uma “receita de bolo” em como fazer a pausa, ao depender da atividade e seu nível de complexidade. Ou seja, varia conforme o indivíduo, seu nível de aprendizado, experiência e esforço.

A questão é praticar bastante, mas sempre respeitando a pausa.

Todo começo de um aprendizado novo se dá pela alta frequência de execução. Conforme se desenvolve, para ganhar um salto de performance, precisa haver intervalos. No esporte, por exemplo, a perfeição no aprendizado motor é gerada durante as pausas intermitentes dos treinos.

Qual o efeito da pausa no trabalho?

Nas empresas, a pausa no trabalho pode ser um ato “solitário”, pois gera uma tensão pela imagem que pode sugestionar, da pessoa que “trabalha pouco”. Em alguns casos, pode ser até mesmo confundida com presenteísmo.

Para ser efetiva, a pausa no trabalho tem sempre uma gradação, além de precisar feita em momentos oportunos. As pausas são necessárias para se trabalhar melhor, pois melhora a qualidade de vida..

Os colaboradores são vistos às vezes como mera máquinas produtivas, precisam executar no maior tempo suas tarefas. Como já explicado acima, não funcionamos como arquiteturas de computadores, pois escalamos performance justamente na ausência da execução.

Muitos evitam a pausa para fazer o máximo de afazeres em um determinado tempo, porém acabando ficando mais tempo sem perceber, pois ficam cansados pela ausência do intervalo.

Como fazer a pausa efetiva no trabalho?

A pausa não deve ser feita de qualquer maneira. Existem estudos que confirmam a melhor maneira.

De forma passiva nunca é boa. Em geral, ficar no conceito de “mind wandering”, não é produtivo. Ou seja, ficar sozinho em silêncio num canto, com a mente vagando sem foco ou pensando em qualquer coisa, não aumenta a motivação. Geralmente o humor piora um pouco, o colaborador fica mais introspectivo. 

O melhor jeito de fazer uma pausa é forma ativa, por 15 minutos:  

  • Tomar um café e conversar com alguém sobre amenidades
  • Um jogo o qual esteja acostumado – como fliperama ou tênis de mesa
  • Sair para dar uma caminhada no quarteirão, prestado atenção nos movimentos, de corpo presente

Logo, fazer pausa não é ficar em redes sociais ou ruminar pensamentos aleatórios. A pausa eficiente precisa deixar a mente concentrada, mas sem muito esforço. Precisa ser uma atividade leve, com alguma intenção.

Estudo sobre atividade de concentração

Um estudo publicado pela Applied Cognitive Psychology em 2017, trouxe 87 participantes nos Estados Unidos para uma atividade de concentração.  

O jogo era um ferrorama, um brinquedo que consiste em uma ferrovia com uma locomotiva, vagões, para guiar. O do experimento era composto por um total de 8 trens e 32 interconexões.

O objetivo era monitorar os trens o tempo todo durante 40 minutos, ajustar suas rotas e interseções para não colidirem. Um jogo muito bacana, porém cansativo por demandar muita atenção. 

Foram divididos em grupos:

Grupo 1: não fez pausa, 40 minutos diretamente

Grupo 2:  depois de 20 minutos, fez uma pausa por 10 minutos – ficou em silêncio

Grupo 3:  depois de 20 minutos, fez uma pausa por 10 minutos – pode fazer o que quiser, como mexer no celular

Grupo 4:  depois de 20 minutos, fez uma pausa por 10 minutos – precisaram assistir um vídeo clipe do grupo Coldplay

Os resultados: 

Grupo 1: teve mais erros de todos, pois ficou mais cansado 

Grupo 2: teve erros igual grupo 1, porém achou menos cansativo

Grupo 3: errou menos do que grupo 1 ou 2, porém tanto quanto o grupo 4

Grupo 4: errou menos do que grupo 1 ou 2, errou tanto quanto o grupo 3, porém com uma variabilidade (e não média) menor de erros – ou seja, teve um controle melhor, logo o mais eficiente dos 04 grupos

Assim, aprende-se na ausência, pois o cérebro organiza melhor a tarefa. A memória se desenvolve durante a pausa, a qual precisa ser um tarefa diferente da qual já estava executando, devendo ser menos complexa para o indivíduo. Em atividades motoras, para novas competências ou durante o trabalho, a eficiência tem a ver com repetição e pausa inteligente.

Por isso, deve-se questionar o papel do trabalho: produtividade é diferente de ter eficiência! A produtividade é por repetição, quanto mais se faz, mais se entrega. Porém, a eficiência é sempre o fazer melhor. Só com as pausas que se consegue transcender.

Na natureza pela teoria de Darwin, a seleção da nossa espécie foi garantida pela nossa eficiência. Isso é fundamental para que qualquer colaborador ou gestor consiga fazer seu trabalho melhor.

Entender e divulgar esse conhecimento é fundamental para a gestão de pessoas e bem-estar da saúde mental de todos.

Fonte:  Naruhodo #377 – Aprendemos melhor fazendo pausas?

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